Janaina Paschoal: “O maior risco vem do Supremo”

Autora do pedido que derrubou a ex-presidente Dilma Rousseff, advogada se diz preocupada com manifestações dos ministros do STF

Janaina Paschoal: "O maior risco vem do Supremo" Alessandro Dantas/Divulgação

Janaina durante depoimento à Comissão Especial do Impeachment no Senado, em 28 de abril de 2016   Foto: Alessandro Dantas / Divulgação

 

Por: Juliana Bevilaqua

 

Autora do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, Janaina Paschoal leva uma vida normal um ano após o início do processo que levou à queda da petista. Atua como advogada e leciona na USP. Diz que segue sendo reconhecida nas ruas e as pessoas, inclusive, a agradecem pela iniciativa.

O governo Michel Temer, para Janaina, tem encaminhado as reformas necessárias, porém, deveria afastar os ministros citados na lista do relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin. Janaina, que no último ano recebeu convites para concorrer, não se filiou a nenhum partido, mas não descarta no futuro disputar algum cargo público. Sobre o futuro do país, diz temer que decisões do juiz Sérgio Moro sejam destruídas. Confira a entrevista concedida por telefone na quarta-feira da semana passada:

Pioneiro: Um ano após o início do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, qual a sua avaliação?
Janaína Paschoal: A minha avaliação é de que aquele processo foi o início desse processo de depuração que o país está vivendo. Se não fosse esse processo de impeachment, com toda a transparência que teve e o nível de detalhamento, o que acho muito importante, a amplitude das discussões, muito provavelmente a Lava-Jato não teria conseguido a força que ela conseguiu. Foi mediante a transmissão daquelas sessões enormes e infindáveis do impeachment, com toda a discussão sobre as fraudes na contabilidade pública, sobre a instrumentalização do BNDES e dos bancos públicos em geral, e mesmo, apesar do Cunha não ter recebido a nossa denúncia na íntegra, na nossa denúncia já falávamos desse escândalo todo da Petrobras, da Odebrecht, esse conluio Lula-Odebrecht-Dilma. Nós explicamos muito isso, então, acho que a visibilidade do processo, a importância histórica dele, deu força para tudo isso que está acontecendo em termos de, sejam apelações, a manutenção de prisões. Meu olhar é um olhar muito positivo.

Qual a sua avaliação sobre o governo Temer?
Tem sempre que lembrar que quando pedi o impeachment da Dilma eu não estava pedindo para colocar o Temer no lugar dela. O Temer, por força da Constituição Federal, sendo vice, teria que assumir naturalmente. Sempre acho que é importante destacar que quem votou no Temer foram os petistas, não fui eu. Acho que, na medida do possível, ele tem, pelo menos, tocado as reformas que são necessárias, colocado esses projetos em discussão. O que acho que ele demora muito é para afastar pessoas que estão envolvidas em denúncias. No lugar dele, afastaria pessoas envolvidas em delações, apontadas em muitos ilícitos, mas sob o ponto de vista das reformas, acredito que elas sejam necessárias, até em virtude de todos os desvios perpetrados pelo PT.

Qual sua opinião sobre o processo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pode cassar a chapa Dilma-Temer?
Não tive acesso aos documentos. Esse processo tramita sob sigilo. Mesmo os depoimentos, se você reparar, a gente fica sabendo de pequenos trechos. O que acho é que o Tribunal tem que julgar de maneira técnica, olhando as provas. Se houver mesmo provas,  tem que cassar. Não estou dizendo que tenha que cassar, mas se houver, tem que cassar. O Brasil tem que perder o medo de aplicar a lei. Nós temos muito isso na nossa cultura ou na nossa falta de cultura. Ah, se a pessoa é poderosa, para manter a estabilidade, a gente encobre situações. Acho que o brasileiro tem que aprender, olha, fez, tem que ter a resposta institucional para isso. Acho que nosso país ainda é muito leniente. Eu, realmente, quando pedi o impeachment da presidente, vinha colacionando muitas notícias, muitos documentos, estava convencida desse conluio do Lula com a Dilma e a Odebrecht, mas com o advento das delações da Odebrecht, a gente vê que a coisa é muito pior do que eu imaginava. E eu não vejo saída a não ser a aplicação da lei. Não dá mais para ficar entrando em acordão. A pior coisa que poderia acontecer para o Brasil seria um acordão para salvar todo mundo.

O que mudou na sua vida após toda a exposição que o processo de impeachment te deu?
Continuo dando as minhas aulas, continuo trabalhando normalmente no meu escritório. Em termos de acréscimo, de ganhos patrimoniais, não houve nada nesse sentido, muito pelo contrário, fui obrigada a abrir mão de muitas causas para não haver nenhum tipo de incompatibilidade. A mudança objetiva é mais assim, em todo lugar que eu vou, as pessoas me reconhecem, me param para agradecer, alguns pessoas de maneira muito emocionada. Um reconhecimento da sociedade muito grande, um carinho, um amor muito grande eu tenho recebido. Mas sob o ponto de vista do meu dia a dia, está normal.

Acontece também o contrário, de a senhora ser escrachada?
Pessoalmente, não. Abri um Twitter depois disso tudo, porque criaram muitos perfis falsos. No meu Twitter, as pessoas que não concordam ou até pessoas que eu acho que têm ligação partidária ficam fazendo acusações, xingamentos, mas tudo no online, tudo no virtual.

No ano passado, a senhora fez um discurso bastante inflamado na faculdade de Direito da USP, dizendo que o Brasil não era uma República das Cobras. O episódio acabou virando piada nas redes sociais. Isso ainda acontece e como a senhora lida com isso?
Eles precisam me ridicularizar para desmerecer o que eu falo. Se você pegar aquele meu discurso e todos os outros discursos que eu fiz e peças que redigi durante esse processo inteiro e ler de maneira não enviesada, se você não colocar nenhum caráter ideológico, você vai ver que eu tenho razão. Mas eles precisam me estigmatizar, criar esse estereótipo de louca, para que as pessoas não me ouçam. Mas aquele que se dispõe a ouvir sem fazer nenhum tipo de juízo de valor, vai perceber que tenho razão. O problema é que eu não tenho grupo. Não sou identificada nem com pessoal pró-PT nem com o pessoal pró-PSDB, porque o PSDB defendeu e encobriu o PT a vida inteira. Isso é muito complicado, porque, infelizmente, o Brasil está acostumado a olhar o mundo sob uma perspectiva dualista: ou você está com A ou você está com B. E eu estou com o Brasil. Chega da gente ser saqueado.

A senhora tem filiação partidária?
Não.

E recebeu convites nesse período?
Muitos.

Não teve interesse em nenhum momento?
Alguns partidos vieram me perguntar se eu não queria sair como candidata ao Senado e também para deputada federal e falei dentro do Congresso que eu não iria me candidatar, então, eu tenho palavra. Não aceitei esses convites. E foram vários. Agradeci, claro que é uma deferência. Mas não descarto na vida futura, mas a princípio meu plano nunca foi entrar na política partidária.

Que partidos lhe procuraram?
Como eles não divulgaram, peço desculpas, mas prefiro não falar.

A senhora chegou a afirmar que a família do seu marido era de petistas.
É, os pais e a irmã.

São filiados, militantes?
Militantes, são. Se eles são filiados, não sei te responder. São petistas aguerridos.

Como é a relação com eles?
A relação familiar é boa, mas não falamos desses assuntos. É uma boa relação, não é conflituosa, mas esse é um assunto proibido.

Algum arrependimento ou a senhora faria tudo de novo?
Faria tudo de novo.

Tudo de novo e tudo igual?
Não houve um planejamento, as coisas foram acontecendo, também, porque aquilo foi um turbilhão. Quem olha de fora acha assim: ah, o pessoal planejou fazer assim, fazer assado. A única coisa que eu tomei a cautela foi de fazer tudo com muita base legal, tudo muito estudado, muito fundamentado sob o ponto de vista jurídico. Agora, eventualmente uma entrevista, um discurso, tudo aquilo foi um turbilhão e regado a muita pressão, a muita ameaça. Não dá para as pessoas planejarem tudo na vida. Talvez eu não tivesse me envolvido tanto emocionalmente, sofrido tanto, mas fazer o pedido de impeachment, tocar o processo, eu faria de olhos fechados novamente. Acho que o Brasil foi salvo de virar uma Venezuela num curto espaço de tempo.

Fonte: Pioneiro

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